Murphy

Zeca juntou suas coisas rapidamente. Em cinco minutos já havia arrumado a mochila e dirigia-se à porta. Era um dia ensolarado, mas levou guarda-chuva. Nunca se sabe quando os deuses podem desgostar da Terra e mandar um belo temporal. Antes de sair, quis ter certeza que carregava a barraca. Não. Voltou, entrou no quarto e quando viu, esquecera a barraca em cima da cama.

Fazia muito tempo que ele não saía para acampar. Aliás, se tivesse saído na ultima semana com a galera da faculdade, teria visto que a lona da barraca estava rasgada. Mas de qualquer forma ele não ia usá-la...

Botou a mão no bolso da velha calça jeans que vestia e sentiu que as passagens do ônibus estavam lá onde havia deixado. “Legal”, disse sem emoção na voz. Estava na rua novamente quando se lembrou que não havia trancado as portas da casa, o que seria um problema depois, pois ele não estaria com as chaves quando voltasse para casa. Trancou, pôs a chave em um bolso escondido da mochila e saiu, dessa vez definitivamente.

Zeca morava há duas casas do terminal rodoviário. O barulho gerado pelo fluxo de ônibus já não incomodava mais. Ele até sentia falta quando ia para algum lugar onde não havia barulho de cidade. Zeca gostava de cidade tanto quanto gostava de mulheres, que eram na verdade, suas paixões. O pessoal da faculdade o convenceu uma vez a largar o computador e ir acampar, mas na mesma semana, a Tia do Zeca morreu e claro que todos entenderam porque ele não foi. (Na verdade, Tia é o nome de uma cadelinha velha que a mãe de Zeca criava e que morreu envenenada. Ela latia muito e os vizinhos “deram um jeito nela”.)

Dessa vez, Zeca viajava por espontânea vontade. Ele mesmo comprou as passagens e planejou a viagem. Desenterrou a mochila do fundo do armário e costurou uns buracos que ela tinha. Estava sendo o verdadeiro escoteiro que ele não era há vários anos. Estava até ansioso.

Zeca só não esperava que naquele passeio, justamente no dia em que ele resolvia voltar à velha vida, uma bela tempestade cairia e o guarda chuva não seria suficiente para preencher o rombo na barraca. Sem falar na enxurrada que levou suas coisas, deixando-o completamente “à mercê”. Voltou para casa com a única coisa que restava: a dignidade estampada na cara. Porta trancada. “DROGA!”, dessa vez demonstrava pequena veia de raiva. Arrobou a porta da frente sem se lembrar que num arbusto próximo havia uma chave reserva. Zeca não esperava que houvesse algum sistema de alarme, mas sua mãe colocara na semana antes. A polícia chegou rapidamente e o prendeu. Não quiseram ouvi-lo.

Na cela da cadeia, leu uma frase escrita com o que parecia sangue: “A lei de Murphy existe. Se você está lendo isso, significa que estou certo.”.

“LEI DE MURPHY! E lá acredito nessas coisas?”

Foi só terminar de falar que a chuva começou e uma goteira molhou o colchão onde estava... Boa noite, Zeca. Boa sorte com o julgamento. Que você consiga sair daí aos 60 anos.

“Esse narrador onisciente! Para de narrar essa merda e vai durmir, ô idiota!”

Acho que meu sub-consciente acabou de escrever isso daí!

Boa noite!

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