Pedro Poderd I


Dezenas de calçados brilhantes se amontoavam, cada um com o seu preço, sua oferta. Apesar de não ser grande, a vitrine acomodava 150 diferentes modelos de calçado. Dos mais discretos aos mais exóticos, todos estavam impecavelmente distribuídos de forma simétrica, dos menores aos maiores. Depois de o que pareceram horas, Pedro Poderd I parou àquela vitrine: ele precisava de um tênis; O que ele tinha já não estava bonito, mas não era velho. Ele o usava bastante, pois era o único par de sapatos decente que tinha. O outro par que ele tinha foi comido pelo cachorro da sua irmã, Angélica. Envergonhada pela atitude do animal, ela lhe deu dinheiro para que Pedro comprasse outro.

Pedro não gostava de shoppings, pois nunca comprava nada. Ele tinha dinheiro, mas a infinidade de opções para qualquer coisa que quisesse comprar torturava-no. Ele não conseguia escolher um simples par de sapatos para poder usar. A indecisão era tamanha, que se ele fosse comprar uma calça, Pedro andaria por todas as lojas que vendem calças, olharia os melhores preços, compararia com outra loja para no fim das contas, escolher a mais barata. Mas ele não comprava. ‘Será que a calça mais cara é melhor?’ pensava. ‘Ou será que essa com menor preço é tão boa quanto?’. Voltava então à outra loja para dar outra olhada na outra calça. Por fim, decidia que não compraria mais calça nenhuma, pois já havia se cansado de ficar dando voltas.

O que Pedro tem foi comprado impulsivamente. Ele precisava de um celular, mas não quis sair para procurar e comprar um novo. Assim, ficou meses sem um. Um dia, andando pelo shopping, viu um celular e comprou. Dois dias depois cansou do aparelho e sabia que devia ter comprado um outro melhor e mais barato (também estão nessa lista roupas, eletrônicos, o carro e a casa em que mora). Poucas vezes Pedro esteve certo do que queria, mas ainda assim, passava vários minutos – ou quase horas – perguntando ao atendente as vantagens e desvantagens do produto, mesmo conhecendo todas elas. Pagava se perguntando se estava fazendo a coisa certa.

Somente um mês depois que Poderd I parou àquela vitrine daquela loja de sapatos, no centro comercial da cidade (que todos chamavam de shopping, mas parecia mais uma feira com uma praça de alimentação) e olhava o grande display com dezenas de calçados brilhantes se amontoando. Pedro já havia passado por duas outras lojas, mas vitrines escuras e sem opções não capturam sua atenção (apesar de não conseguir se decidir, odiava pouca opção).

A primeira coisa que pensou foi comprar um tênis do mesmo modelo do outro comido pelo cachorro: um tênis básico, esportivo, com tecido areado preto nas laterais e solado de borracha cinza. Entrou na loja e sentou no banco para provar a próxima aquisição. O vendedor, um homem alto e magro, chegou em seguida e  Pedro pediu que ele pegasse o par. Já estava decidido. Enquanto o homem buscava o par no estoque, Pedro deixou que seus olhos percorressem pelo interior da loja e reparou num canto algumas caixas com calçados em cima.  Um sapatênis estava à mostra. Era bem simples, bege com cadarço marrom. Pedro achou bonito e, naquele instante o atendente volta com o primeiro tênis na mão. Pedro, já quase decidido que levaria o segundo pede para ele trazer o outro. Dois minutos depois ele chegou com o sapatênis,  mas agora Pedro tem os dois pares à sua frente e não sabe qual vai levar.

‘Qual desses dois você acha que é o melhor?’ Pedro perguntou ao vendedor.

‘O primeiro que eu trouxe é bem mais bonito, senhor.’ O homem disse sem rodeios.

‘Eu já tive um igual, sabe?’ Pedro informou.

‘Hum.’

‘O cachorro da minha irmã comeu.’ Completou.

O vendedor não sabia como continuar a conversa.

‘Acho que vou levar o segundo modelo.’ Pedro concluiu depois de pensar por alguns segundos. ‘Acho que será bom mudar um pouco.’

‘Hum.’

‘Onde eu pago?’ Pedro perguntou.

Depois de pagar, Pedro estava feliz. Pegou a sacola com o tênis e foi para casa, testar a mais nova aquisição. Tirou o tênis que usava e calçou o novo. Ele parecia feio. A cor bege não combinava com a calça que Pedro usava. Na verdade, não combinava com nenhuma peça de roupa que Pedro tinha. O arrependimento veio na mesma hora.

‘Maldito Lucifer!’

            E jogou o par num canto do quarto e nunca mais usou.


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